Humberto Góes

 

A reunião entre militantes de Movimentos Sociais e pesquisadores e pesquisadoras que se engajam em lutas sociais foi o foco da mesa temática deste quarto dia do III Seminário do IPDMS em Natal. Também se destaca entre os acontecimentos deste dia o lançamento de livros e a retomada das apresentações e debates de trabalhos científicos sobre projetos e pesquisas engadas em lutas sociais.

Na manhã deste dia 31 de maio, em mesa presidida por Socorro Diógenes (estudante de Direito da UERN), reuniram-se Renata Rolim, professora da Universidade Federal da Paraíba; Conceição Dantas, militante da Marcha Mundial de Mulheres e Sílvio Almeida, professor da São Judas Tadeu e advogado do Instituto Luiz Gama em São Paulo.
Ao abordar o Direito à Comunicação, Renata Rolim analisa a relação entre a atuação dos meios de comunicação e a perda de direitos conquistados pela luta dos Movimentos Sociais durante o processo de elaboração da Constituição promulgada em 1988. Para a professora, os meios de comunicação são aparelhos privados de disputa de hegemonia e, em alguns casos, atuam como partidos que reúnem frações de classe que podem também influenciar na disputa da direita e da esquerda, ao determinarem quais são as necessidades humanas e o modo como a sociedade deve ser ordenada.
Em contrapartida ao conceito de comunicação que se pode depreender da ação dos meios de comunicação de massa no Brasil, Renata recupera o conceito de comunicação de Paulo Freire, segundo quem a comunicação evolve uma relação entre iguais, para defender a busca por formas de comunicação que favoreça as lutas do povo a partir de mecanismos que possam criar unidade entre os Movimentos Sociais e, com isso, disputas de hegemonia. “As lutas por meios de comunicação, a disputa ideológica e a formação de novos quadros são os nossos desafios”, segundo Renata Rolim.
Dando continuidade à mesa temática, Conceição Dantas inicia sua fala com uma análise de conjuntura das lutas sociais na América Latina. Para a representante da Marcha Mundial das Mulheres, na América Latina, tem havido uma busca por unidade entre os Movimentos Sociais com avanços na disputa pelo modelo de desenvolvimento. Segundo Conceição, também é possível perceber na América Latina transformações frágeis e ambíguas a partir do Estado, com a atuação de governos progressistas e com a luta empreendida pelos Movimentos Sociais. Porém, há um avanço do capital com o uso de mecanismos, tais como o controle dos recursos naturais e do corpo das mulheres, transformando-os em mercadoria.
Sobre a regulamentação do trabalho doméstico, Conceição Dantas aponta que esta não discutiu o elemento central da questão, a divisão sexual do trabalho. Para ela, são as mulheres que ainda são as principais responsáveis pelo trabalho doméstico e aquelas que se ocupam de duas fases importantes da vida, intimamente ligadas a este tipo de trabalho, as crianças e os idosos. Por isso, sobre seus ombros ainda se concentra a dupla jornada de trabalho. No âmbito da família, ainda não se deu co-responsabilização de todos e todas pelos afazeres domésticos, é o que afirma Conceição Dantas.
Para abordar a temática do racismo, Sílvio Almeida, primeiro, incita o debate sobre a relação entre Direito e Movimentos Sociais ao tempo que se indaga sobre o que podem ser estes Movimentos. Para o professor, há três elementos que caracterizam uma organização como Movimento Social: identidade; existência de um adversário comum e de um projeto político comum. É uma tarefa entender o sentido da ação política e como os Movimentos Sociais lidam com a luta política.  Em alguma medida, o Direito se mostra sensível a essa luta, mas ele não tem condições de acabar com o racismo porque o Direito é uma expressão da classe dominante para promover a sua dominação. Daí os limites da luta por direitos, conforme afirma Sílvio.
Após a mesa temática, a manhã desse quarto dia do III Seminário terminou com o lançamento dos livros: Direito à Comunicação – possibilidades, contradições e limites para a lógica dos movimentos sociais, publicado pela Oito de Março Gráfica e Editora, de Renata Rolim; Se trabalho é um direito, ocupar é um dever! – a constitucionalidade das greves de ocupações de fábricas (Coleção Textos Jurídicos – Volume I), publicado pela CEMOP, de Alexandre Tortorella Mandl; Mapa territorial, temático e instrumental da Assessoria Jurídica e Advocacia Popular no Brasil, de autoria da Terras de Direitos e Dignitatis Assessoria Técnica Popular; Infância e Juventude em contextos de vulnerabilidades e resistências, publicado pelo OBJUV, de organização de Ilana Paiva, Marlos Bezerra, Geórgia Sibele, Nogueira e Périsson Nascimento; Coleção Direitos e Lutas sociais, publicado pela Outras Expressões, seguimento da Editora Expressão Popular.
No período da tarde, foram retomadas as apresentações e discussões de trabalhos científicos situados nas temáticas: Gênero e Direito; Assessoria Jurídica Popular, Educação Jurídica e Educação Popular; Cidade; Direito e Marxismo; Formas e práticas de produção de conhecimento na América Latina; Infância e adolescência; Mundo do trabalho, movimento sindical e Direito; Mídia, direitos e polít
icas de comunicação; Participação popular e espaço urbano: por uma construção democrática das cidades; e, Povos e comunidades tradicionais, políticas de desenvolvimento e conflitos socioambientais.
Segue o resumo dos livros lançados no dia de ontem, de acordo com o que afirmam seus autores e autoras:
 
1 – Mapa temático, territorial e instrumental da Assessoria Jurídica e Advocacia Popular no Brasil
Publicação: Dignitatis e Terra de Direitos
Trata-se do resultado de pesquisa desenvolvida durante o ano de 2011/2012 pelas organizações de Direitos Humanos Terra de Direitos e Dignitatis Assessoria Técnica Popular com o objetivo de construir um Mapa da assessoria jurídica e advocacia popular no Brasil, a partir de um Edital de pesquisa do Observatório da Justiça Brasileira (OJB) e da Fundação Ford.
A advocacia popular é um instrumento relevante no cenário de luta pela democratização do acesso à justiça pela via dos direitos no Brasil. Daí a relevância do trabalho, que busca mapear as entidades da sociedade civil que atuam com a promoção, defesa ou reparação de Direitos Humanos junto ao Judiciário brasileiro e também aos Organismos Internacionais.
A inovação metodológica com a utilização de uma plataforma cartográfica para inserção dos dados destas organizações – indicando os pontos de cobertura jurídica na luta por direitos no Brasil e também apontando as lacunas dessa cobertura – é um diferencial deste trabalho. Além disso, o trabalho fortalece a agenda de pesquisas que se vinculam à atuação destas entidades em nível nacional, sempre com o foco no fortalecimento da dimensão político-jurídica da luta por direitos por parte dos movimentos sociais e populares do Brasil, ampliando e ressignificando o próprio conceito de acesso à justiça.
2 – Infância e juventude em contextos de vulnerabilidades e resistências
Publicação Obijuv
Organizadores e organizadoras: Ilana Paiva, Marlos Bezerra, Geórgia Sibele, Nogueira e Périsson Nascimento
Este livro apresenta-se como instrumento norteador para estudantes e profissionais da Psicologia e áreas afins, fornecendo subsídios teóricos para o ensino acadêmico, constituindo-se também de grande valia para aqueles que trabalham com contextos de violação de direitos de crianças e jovens nos campos da assistência, saúde e educação. São discutidas experiências e pesquisas locais, como também reflexões a partir de estudiosos de outros estados do país, a fim de contribuir para se pensar nos contextos de atuação profissional, no fenômeno da violência em torno de crianças e jovens e suas relações com as políticas vigentes.
3 – Direito à comunicação: possibilidades, contradições e limites para a lógica dos Movimentos Sociais
Autora: Renata Rolim
O livro tem por objetivo investigar as possibilidades, contradições e limites que no direito se apresenta quando das tentativas de incorporar iniciativas que, na disputa pela direção cultural e moral do bloco histórico, propõem modelo de comunicação tendente a romper com o uso hegemônico daquelas tecnologias no sentido de fomentar a organização coletiva. Para isso, e a partir da dinâmica da luta de classes e da configuração do espaço midiático brasileiro, foca a análise em dois momentos históricos distintos: o processo de transição da ditadura militar para a democracia e a elaboração da Lei das Rádios Comunitárias. Discute ainda os novos contornos do direito à comunicação em países da América Latina que enfrentaram as forças políticas neoliberais, cujo exemplo mais evidente é a Ley de Medios da Argentina. Com isso, pretende somar-se às contribuições teórico-práticas que lutam pela constru
ção de novas relações sociais no processo dialético de emancipação humana.
4 – Coleção Direitos e Lutas sociais
Num esforço coletivo de seus editores e autores, bem como do diálogo permanente com organizações populares e movimentos sociais, a coleção Direitos e Lutas Sociais surge com o objetivo de publicar obras voltadas a debater as relações atuais entre o direito e temas de interesse para as lutas sociais, promovendo a investigação de aspectos que, em geral, ficam obscurecidos pelo discurso tradicional do meio jurídico.
Num esforço coletivo de seus editores e autores, bem como do diálogo permanente com organizações populares e movimentos sociais, a coleção Direitos e Lutas Sociais surge com o objetivo de publicar obras voltadas a debater as relações atuais entre o direito e temas de interesse para as lutas sociais, promovendo a investigação de aspectos que, em geral, ficam obscurecidos pelo discurso tradicional do meio jurídico.
Neste sentido, ao reunir vozes críticas – em obras monográficas ou coletivas – que estão dispersar em instituições de todo o país, seu intuito principal é assumir a importante tarefa crítica de desvelar como os mecanismos jurídicos são manejados para a dominação e, também, como podem ser usados contra essa mesma dominação, a fim de disputar com seriedade este campo estratégico para as lutas práticas e teóricas.
Já foram lançados os seguintes livros: O direito do campo no campo do direito: universidade de elite versus universidade de massas, organizado por Aton Fon Filho, José do Carmo Alves Siqueira e Juvelino Strozake; Justiça de transição: contornos do conceito, de Renan Honório Quinalha, e a segunda edição de Direito e Ideologia: um estudo a partir da função social da propriedade rural, de Tarso de Melo.
Ainda neste semestre serão lançados os livros Direito e Saúde Global: o caso da pandemia de gripe A(H1N1), de Deisy Ventura, e Crítica da tecnologia dos direitos sociais, de Flávio Roberto Batista, além de outros que ainda estão sob avaliação.
5 – Se trabalho é um direito, ocupar é um dever! – a constitucionalidade das greves de ocupações de fábricas (Coleção Textos Jurídicos – Volume I)
Autor: Alexandre Tortorella Mandl
A constitucionalidade das greves de ocupações de fábrica: uma análise para a superação do conflito entre o direito de greve e o direito de posse de Alexandre Tortorella Mandl é uma pesquisa científica com todos os seus rigores, méritos e louvores. Porém, não se restringirá às estantes de uma biblioteca da instituição que lhe credenciou. Trata-se de um estudo comprometido com a provocação ao debate jurídico, sociológico e político.
Mais que isso, fruto da realidade material vivenciada pelo autor e de sua inquietude e indignação, trata-se de uma obra dialética compromissada em transformar as ideias e as práxis. O autor desnuda e expõe as contradições da lógica do capital, especialmente no que tange a produção e circulação de mercadorias e suas relações com o Direito e a exploração do trabalho e do ser humano. E o procura fazer a partir de uma linguagem e um método acessíveis e didáticos.